George-Jacques Danton (1759 a 1794), líder da revolução francesa, ao ser questionado sobre seu endereço pelo juiz de instrução do processo que o levou à guilhotina, vaticinou: “em breve, o nada; ao depois, o panteão da história”.

O dia 30 de outubro de 2022 já reservou seu lugar no panteão da história brasileira, imediatamente após o encerramento do segundo turno das eleições presidenciais, não dependendo, portanto, do “ao depois”.

Isso porque, nesse dia, nada menos que 60,3 milhões de eleitores/as disseram sonoro não a Bolsonaro e às trevas que ele encarna e representa, fazendo opção pela ordem democrática que ele renega e afronta, desde o primeiro ato de seu nefasto governo. A eleição da chapa Lula-Alckmin congrega a maior e mais ampla aliança política que se tem registro, em todos os tempos, empunhando o projeto de reconstrução do Brasil, que vinha em acelerado processo de devastação em todas suas dimensões.

Parafraseando o imortal poeta Thiago de Mello, em seu magistral poema “Os Estatutos do Homem”, de 1964 — que simbolizou portentoso brado contra a ditadura militar, matriz ideológica de Bolsonaro e do bolsonarismo —, pode-se afirmar que a vitória de Lula representa o primeiro e decisivo passo para a concretização do Artigo I dos estatutos que ele preconizou: “Fica decretado que agora vale a verdade. Agora vale a vida, e de mãos dadas, marcharemos todos pela vida verdadeira”.

Porém, evidencia-se, com clareza solar, que a tarefa mais árdua dos próximos quatro anos, que se iniciarão ao 1º de janeiro de 2023, será a da marcha pela vida verdadeira, feita de liberdades democráticas, paz, pão, trabalho decente, seguridade e assistência social para todos/as, tolerância e respeito à diversidade e à pluralidade de ideias, de concepções pedagógicas, partidárias, filosóficas e de crenças.

Não se pode olvidar, nem por um segundo, que, ao 1º de janeiro de 2023, vai-se Bolsonaro, mas, desafortunadamente, fica o bolsonarismo, que tem matriz, metas e métodos fascistas que são absolutamente avessos aos pressupostos e alicerces da vida verdadeira.

Ainda que não se possa atribuir mecanicamente aos 58,2 milhões de votos dados a Bolsonaro, no segundo turno, a condição de opção consciente pelo fascismo, há de se ter patente que, para gigantesca parcela deles, isso é insuscetível de dúvidas, o que representa obstáculos de grande monta para a construção sob destaque, posto que essas hordas só entendem a linguagem da violência e da força física, inaceitáveis no Estado Democrático de Direito, a se reiniciar com a posse de Lula.

Assim sendo, o laureado dia 30 de outubro de 2022, não obstante consignar o marco decisivo, que fez possível e eleito o projeto de construção da vida verdadeira, cinge-se ao primeiro passo dessa complexa e difícil batalha, sem tempo certo para conclusão exitosa, o que somente poderá ser concretizado com a preservação intacta da aliança entre diferentes, em busca de objetivo comum, que a fez possível: a reconstrução do Brasil.

Para além disso, há de se manter severa vigilância aos nefastos propósitos de Bolsonaro, nos longevos dois meses que ele estará à frente do governo, infelicitando a nação; tempo que pode ser bastante para ele multiplicar a devastação do Brasil.

Por ora, a tarefa primeira é da comemoração e do regozijo pela inapagável vitória da luz e da esperança contra as trevas sem fim.

Com incentivo a esse extravasar da alegria, traz-se a poética música de Paulo César Pinheiro — escrita aos 15 anos de idade —, “Viagem”, com a sugestão de intertextualidade:

“Oh! tristeza me desculpe
Estou de malas prontas
Hoje a poesia
Veio ao meu encontro
Já raiou o dia
Vamos viajar
Vamos indo de carona
Na garupa leve
Do vento macio
Que vem caminhando
Desde muito longe
Lá do fim do mar
Vamos visitar a estrela
Da manhã raiada
Que pensei perdida
Pela madrugada
Mas que vai escondida
Querendo brincar
Senta nessa nuvem clara
Minha poesia
Anda se prepara
Traz uma cantiga
Vamos espalhando
Música no ar
Olha quantas aves brancas
Minha poesia
Dançam nossa valsa
Pelo céu que o dia
Faz todo bordado
De raio de sol
Oh! Poesia me ajude
Vou colher avencas
Lírios, rosas, dálias
Pelos campos verdes
Que você batiza
De jardins do céu
Mas pode ficar tranquila
Minha poesia
Pois nós voltaremos
Numa estrela guia
Num clarão de lua
Quando serenar
Ou talvez até quem sabe
Nós só voltaremos
No cavalo baio
No alazão da noite
Cujo nome é raio Raio de luar”

 

Por José Geraldo de Santana Oliveira - consultor jurídico da Contee

Fonte: contee.org.br/

 

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